Artigo – 07.07.2011

PRISÃO

Por Guto Rodrigues Tanajura (*)

Entrou em vigor, nesta semana, a Lei Federal nº. 12.403, de 4 de maio de 2011, que altera dispositivos do Código de Processo Penal, Decerto-Lei nº. 3.689, de 03 de outubro de 1941, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, bem como estabelece outras formas de medidas cautelares.

O novel dispositivo, que vem sendo considerado como Novo Código de Processo Penal, tem gerando amplos debates no meio jurídico e acadêmico, sobretudo por tratar, em destaque, de um tema tão comum na seara social e policial: a prisão.

O cerceamento da liberdade como consequência da prática de um delito se apresenta no arcabouço jurídico brasileiro de duas formas, sendo a primeira e mais comum a que resulta de sentença criminal transitada em julgado, ou seja, individuo que foi condenado em processo criminal onde não caibam mais recursos, aqui se fala em prisão/pena.

O segundo significado de prisão é de ordem processual, isto é, a pessoa tem sua liberdade cerceada, através de prisão preventiva ou temporária, por exemplo, mesmo antes de ostentar condenação criminal definitiva, para atender a garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal.

Nesses casos, exige-se prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria, para evitar a prática de outros delitos. Por essa razão, é que se fala em prisão cautelar, que pode ser decretada pelo juiz, na fase policial ou judicial do processo penal.

Em que pese o postulado constitucional da presunção de inocência, previsto no art. 5º, LVII, da CF, pelo qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, a prisão cautelar, na modalidade prisão preventiva, é bastante utilizada no meio jurídico, seja para atender representação da autoridade policial (delegado de polícia) ou a requerimento do Ministério Público (promotor de justiça).

Outra modalidade da prisão cautelar bastante conhecida é a prisão temporária, prevista na Lei nº. 7.960, de 21 de dezembro de 1989, utilizada somente na fase investigativa, para apuração de crimes graves.

Em razão de prisão definitiva ou cautelar, a população carcerária brasileira soma hoje 496 mil pessoas, das quais 183 são presos que aguardam julgamento, ou seja, estão custodiados cautelarmente. Isso causa sérios transtornos ao Estado, que não dispõe de presídios suficientes para abrigar, com dignidade, todos eles.

Essa situação tem estimulado a adoção, como política criminal, da substituição da pena privativa de liberdade pelas chamadas penas alternativas, sendo a mais popular delas a prestação de serviço à comunidade.

Esse modelo de política criminal surgiu, primeiro, com a Lei 7.209, de julho de 1984, que introduziu no Código Penal as penas restritivas de direito: prestação pecuniária; perda de bens e valores; prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas; interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana (redação dada pela Lei nº. 9.714, de 25 de novembro de 1998).

Em seguida, a veio a Lei Federal nº. 9.099, de 26 de setembro de 1995, que criou o sistema dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, com competência para julgamento e execução de infrações penais de menor potencial ofensivo (crimes ou contravenções com pena máxima não superior a dois anos), onde não comporta prisão em flagrante, apenas encaminha o autor do fato (primário e de bons antecedentes) para conciliação, transação ou suspensão do processo.

Ainda referente à Lei nº 9.099/95, ela cuida dos Juizados Especiais como um todo, não se distingue mais se a competência é da justiça federal ou estadual, a discussão que existia neste sentido já foi superada.

De acordo com o novo diploma em comento, em especial a nova redação dada ao § 6º do art. 282 do CPP, antes de ser decretada a prisão preventiva, o juiz deverá observar a possibilidade de substituição da prisão por outras cautelares, como arbitramento de fiança, comparecimento periódico em juízo para informar e justificar as atividades, utilização de monitoramento eletrônico, recolhimento domiciliar no período noturno e suspensão do exercício da função pública ou de atividade econômica e financeira, dentre outras.

Outra mudança significativa trazida pela nova lei, art. 322, é a possibilidade da autoridade policial (delegado de polícia) conceder fiança nos crimes com pena privativa de liberdade até quatro anos, dentre eles: homicídio culposo, homicídio culposo de trânsito, porte ilegal de arma de fogo, disparo de arma de fogo, cárcere privado, receptação, apropriação indébita, corrupção de menores, formação de quadrilha, contrabando, de acusados não reincidentes, não necessitando de interferência do juiz ou promotor. Isso aumentará, sensivelmente, as atribuições dos delegados de polícia.

Ainda de acordo com a nova lei, a prisão preventiva só será admitida nos crimes dolosos cuja pena privativa de liberdade seja superior a quatro anos, aos reincidentes (pessoas condenadas por crimes dolosos), ou ainda, como medidas protetivas para atender menores, mulheres, idosos, deficientes, doentes mentais, vítimas de maus-tratos ou violência doméstica.

Portanto, essas medidas constituem um modelo adotado como política criminal pelo Brasil para evitar a privação da liberdade como única forma de sanção de natureza penal, deixando o cárcere somente para criminosos que cometerem crimes com pena privativa de liberdade superior a quatro anos, dentre eles, destacamos os crimes hediondos (homicídio doloso, estupro, extorsão mediante sequestro, roubo, crimes contra o sistema financeiro) ou delitos equiparados a hediondos, como tráfico ilícito de entorpecentes, tortura e terrorismo.

Na Bahia, segundo dados do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça, a população carcerária é de 15.500 presos, destes, 7.700 aguardam julgamento e podem ser beneficiados pela nova lei. Contudo, a liberdade destes não é automática, cada caso será avaliado pelos juízes antes de qualquer decisão.

Resumindo, a nova lei trouxe apenas mudança pontual no que diz respeito à prisão processual, fiança, liberdade provisória e introduziu no sistema algumas medidas cautelares para substituir pela privação da liberdade.

No tocante ao juiz das garantias, aquele que decreta a prisão cautelar não ser o mesmo juiz que cuidará da instrução e julgamento, previsto no texto do anteprojeto, esta medida não foi aprovada, ainda, por falta de estrutura do aparato estatal.

Por último, vale lembrar que, como lei processual se aplica imediatamente, a partir de sua vigência, os que estiverem presos preventivamente, não forem reincidentes ou não se tratar de crimes contra menores, idosos, deficientes físicos ou mentais, já podem requerer revogação da prisão preventiva ou impetrar habeas corpus.

Repita-se, contudo, que cada caso será analisado, de per si, pelo juiz, que deverá justificar, em decisão fundamentada, a manutenção ou não da prisão.

(*) Guto Rodrigues Tanajura é advogado.