Biografia – 02.04.2016

Donatila Villas-Bôas
Teixeira (Dona)

 

Por Raul Teixeira

(filho)

No dia 28 de março de 2016, faleceu, aos 90 anos, Donatila Villas-Bôas Teixeira (Dona de Álvaro, ou, simplesmente, Dona), no Hospital Municipal de Livramento de Nossa Senhora. Foi sepultada, no dia 29, no cemitério da cidade.

Descendente de tradicionais famílias daqui, nasceu Donatila Meira Villas-Bôas, em 06 de abril de 1925, filha do casal Tibério de Castro Villas-Bôas e Antônia Meira Villas-Bôas, vindo a se casar, em 1943, quando passou a adotar o seu nome definitivo.

Aos 6 meses de idade, perdeu o seu pai, do qual, obviamente não tinha a mínima lembrança, conhecendo-o apenas por uma foto, daí ter sido criada pela sua mãe, na companhia de seus irmãos Hildete Villas-Bôas Tanajura (Dete de Mário), José Meira Villas-Bôas (Duca), Manoel Meira Villas-Bôas (Nino) e João Batista Villas-Bôas (Baité), todos já falecidos Fez-lhe companhia ininterrupta, desde o seu nascimento até o seu casamento, Elisa de Jesus Pereira, uma irmã adotiva, também já falecida a quem ela considerava e estimava como se irmã legítima fosse.

Em 1943, aos 18 anos, casou-se com Álvaro Alves Teixeira (Álvaro de Seu Lindolpho), também livramentense, porém oriundo de famílias do vizinho município vizinho de Rio de Contas, o qual exercia a profissão de seleiro, a mesma do seu pai Linfolpho. O casal teve 11 filhos (Raul, Marília, Valter, Margarete, Ivan, Álvaro, Neves, Cesar, Sergio, Nélson e Socorro) entre esses a filha caçula, a Enfermeira Maria do Socorro Villas-Bôas Teixeira, (apelido Birro), pessoa muito conhecida e muito querida por grande parte da nossa população, por ter trabalhado, durante 23 anos, no Hospital Municipal, exercendo a sua profissão, com total dedicação, zelo e carinho para com todos os pacientes e servidores, independentemente do status social.

Em 1949, o seu irmão João Batista, residente em Salvador, havia muitos anos, um homem de larga visão, fundou o Ginásio de Livramento, o atual Colégio João Villas-Bôas, cuja primeira turma o inaugurou em 1950. Tal estabelecimento de ensino foi o primeiro a oferecer o curso ginasial, em toda a região sul da Chapada Diamantina, abrangendo a população jovem de Livramento e de inúmeros outros municípios, até mesmo de fora da Chapada, como, por exemplo, Brumado (até então, os pais que queriam e tinham condições financeiras que permitissem a continuidade dos estudos dos seus filhos, além do Curso Primário, mandava-os para Caetité, ou, em raros casos, para Salvador, ou outras grandes cidades do país). Para que fossem viabilizadas a administração e as finanças do Ginásio, decorrentes do pagamento das mensalidades, pelos alunos, foi criada a Cooperativa de Educação e Cultura Ginásio de Livramento, como mantenedora da instituição, tendo como presidente a Professora Cremilda Tanajura, logo substituída pelo Sr. Mário do Carmo Tanajura, esposo da já mencionada Hildete, irmã de Dona.

Pouco tempo depois do início do funcionamento do Curso Ginasial, em salas cedidas pela Prefeitura, no endereço em que, até hoje, funciona a administração municipal, aconteceu a transferência para uma pequena construção erigida em um grande terreno doado pelo Coronel Zezinho Tanajura, pai da Professora Cremilda (com o passar do tempo e com o vertiginoso crescimento da cidade, as instalações foram sendo, fisicamente, incrementadas, até alcançar as dimensões, que hoje apresentam).

Já em 1950, Dona assumiu o cargo de Secretária do Ginásio, cujas principais atribuições eram, entre outras: preparar a grade anual do horário de aulas (um verdadeiro quebra-cabeça, em razão da necessidade de atender demandas de alguns dos professores), o controle das cadernetas de aulas com as anotações dos professores, a guarda das provas escritas, a transcrição das notas das provas e das faltas para a Fichas de Controle Individual, de cada um dos alunos, e, em consequência, a apuração da Média Global, um enorme suspense para aqueles que passavam de ano, ou perdiam o ano, raspando, como se dizia, na época. Além dessas atribuições, Dona também era responsável pela arrecadação dos recursos, sempre em dinheiro vivo, pela preparação da folha de pagamento e pelo pagamento dos professores e demais empregados, em envelopes contendo dinheiro, e, por último, mas não menos importante, pela prestação de contas para o Sr. Rodrigo Alves Meira (Seu Tatinha), o Tesoureiro da Cooperativa.

Embora possa parecer estranho para os jovens de hoje, o processamento dessa verdadeira montanha de informações e dados, inclusive e, principalmente, dos cálculos, Dona as executava, manualmente (na unha, como se dizia!), sem auxílio de ninguém e de nenhum equipamento, até mesmo porque não existia nenhum disponível, salvo uma tosca máquina de datilografia. Por um curto período dos anos 50, médios, também tendo a Cooperativa como mantenedora, funcionou, nas mesmas dependências do Ginásio, o Curso Comercia Básico, que era noturno, com o objetivo de formar profissionais para o Comércio, além de conferir o 2º Grau. Foi uma pena que esse curso, por falta de público-alvo, tenha encerrado as suas atividades, certificando apenas a primeira turma. Dona, além de ter sido aluna da segunda turma, daí não ter concluído o curso, exerceu as mesmas funções de Secretária, que já exercia no Ginásio. Idem, em relação ao Curso Pedagógico, instituído no início dos anos 60.

Em 1968, com nove dos onze filhos do casal, em idade escolar e dois, na fila, para nela entrarem, a família se estabeleceu em Salvador.

Durante os dezoito anos em que trabalhou como Secretária, Dona conviveu, quase que diariamente, com ilustres professores, alguns deles autoridades locais, com inúmeros alunos, entre os quais, alguns, mais tarde, se tornaram personalidades de vulto, a saber: um ministro do Superior Tribunal de Justiça; um regente de orquestra, que foi o mais brilhante que o Estado da Bahia já produziu, ambos livramentenses; alguns prefeitos e diversos vereadores de Livramento e de outros municípios; inúmeros profissionais médicos, engenheiros, advogados e professores, essas quatro carreiras, em maior número; diversos outros profissionais de nível superior, e, obviamente, com todos os demais servidores, do mais humilde ao mais graduado, sempre extremamente afável para com todos.

A mudança da família para Salvador, a capital do Estado, acontecida em 1968, se deu em razão de os dois filhos mais velhos, ali já estarem estudando e da perspectiva de os demais nove darem continuidade aos estudos, naquela cidade. A família se instalou como proprietária e gestora da Pensão Majestic, localizada na Rua Monte Alverne, número 25, no Centro. Em tal pensão, muitos conterrâneos se hospedavam, quando iam àquela cidade, a passeio, ou para tratar de assuntos de interesse particular. Por ter tido a oportunidade de consolidar muitas amizades, de Livramento, e de ter feito vários novos e bons amigos, entre os hóspedes de outras cidades, Dona mantinha muito gratas recordações daqueles belos tempos de Majestic.  

Em 1977, já com todos os filhos adultos, muitos deles já casados, conduzindo as suas próprias vidas, o casal desistiu da pensão, mas continuou residindo em Salvador, com os quatro filhos mais novos. Em 1984, faleceu o Sr. Álvaro, o patriarca da família, encerrando-se, dessa forma, um ciclo da história da família.

Em 1993, Dona, tendo a filha Maria das Neves, já fixada em Livramento, por ter se casado com Perpétuo Machado, e o filho Nélson, fixado em Paramirim, onde já estava trabalhando como odontólogo, resolveu, em conjunto com a sua filha Socorro, essa já Enfermeira, única remanescente dos filhos, ainda residindo com ela, que voltariam a residir em Livramento, em termos definitivos. Assim que chegou, Socorro assumiu o cargo de Enfermeira, no Hospital Municipal, por ter sido cedida pela Secretaria de Saúde do Estado da Bahia, da qual é concursada. e em razão de ela jamais ter deixado de acompanhar Dona e, reciprocamente, Dona jamais ter deixado de acompanhá-la, apesar de Socorro ter sido devolvida pela Prefeitura de Livramento para a Secretária de Saúde, no início deste 2016, sob a alegação de que os seus serviços não mais eram necessários, o que se revelou uma inverdade, na medida em que a Prefeitura promoverá concurso para o cargo de Enfermeira, chamando para si um custo que era do Estado, causando, desse modo, um prejuízo financeiro direto, para a municipalidade, Socorro, então, escolheu trabalhar no Hospital Geral de Vitória da Conquista, cidade onde já estudam os seus dois filhos, mas, essencialmente, para que conseguisse trabalhar em regime de plantões duradouros e assim pudesse ter folgas maiores que lhe permitissem viajar para Livramento, para que pudesse, por alguns dias seguidos, em todas as semanas, cuidar, pessoalmente, de Dona, como sempre fez, pois a ela devotava todos os cuidados, porém, em razão do desenlace ocorrido, somente pôde assim agir durante dois meses.

Na sua nova fase, em Livramento, que durou quase 23 anos, apesar de, nesse intervalo, ter ocorrido a amputação de suas duas pernas e de ter perdido seus filhos Ivan, Marília e Nélson, Dona sempre se mostrou inteiramente conformada com tão grandes reveses, por acreditar, piamente, que tudo ocorre pela vontade de Deus, nunca lhe faltando ânimo para continuar cultivando as antigas amizades, além de ter feito muitas outras, vivendo sobre uma cama, por 8 anos, sempre mantendo longas, divertidas e saudáveis prosas com os parentes e amigos que a visitavam, que eram muitos (segundo alguns, havia dias em que mais parecia que estivesse havendo uma romaria!), ou vendo TV, cujo aparelho do seu quarto permanecia quase que permanentemente ligado, e, ao mesmo tempo, fazendo crochê, ou colchas de fuxico (a costura), transmitindo muita ternura, daí ter sido sempre tão querida e admirada por todos que a conheciam.

Apesar dos pesares, Dona foi alguém muito feliz, porque sempre soube, do limão, fazer uma excelente limonada! Ela completaria 91 anos, na próxima semana! Deixou muitas saudades! Segundo um ex-prefeito e grande amigo, “O céu ganhou mais uma santa!”.